segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

A questão da técnica em Martin Heidegger


Heidegger, M. (2002). Ensaios e Conferências. (pp.11-38). Petópolis: Editora Vozes: Petrópolis. pp.11-38

 
MartinHeidegger, foi o pensador do século XX, que mais insistiu na importância da técnica para a compreensão da modernidade. Foi no seu texto “A questão da técnica”, que se encontra a formulação mais completa da sua interpretação.
Heidegger, ao questionar a técnica, dá início a um processo meditativo que tem por finalidade tornar aparente a essência da técnica e daquilo que é técnico.
Heidegger, no início do texto “A questão da técnica” descreve o que ele considerou a relação entre a causalidade e o que há de instrumental na técnica. Sua interpretação dos conceitos de causalidade e télos abre uma nova perspectiva, tanto no fazer como no pensar.
Heidegger apresenta outro tipo de explicação para o que se entende tradicionalmente por causalidade, no sentido de se procurar um fim ou um objetivo. Neste sentido, o fim é o início da coisa criada, na interpretação de Heidegger, é o seu télos. A causa é entendida como um comprometimento entre o que primeiro causou e que, no presente mantém o "efeito".
À medida que existimos, estamos comprometidos com o que nos causa e com o que causamos. Somos culpados por existir, pois estamos comprometidos com nós mesmos. Esse comprometimento amplia-se quando, convocados pela Gestell, correspondemos ao seu apelo, simplesmente calculando. Essa correspondência já é uma "cumplicidade", um comprometimento. É nessa situação que o não-presente se presenta, se produz como poiesis.
Na sua origem, a técnica mais antiga, entendida como techne, já pertence à poiesis. Pode-se afirmar que quer a techne como episteme são modos de desabrigar, e ambas são em sentido amplo, nomes para o conhecer. Ambas, significam ter um bom conhecimento de algo, ter uma boa compreensão de algo.
A técnica moderna é também um desabrigar, mas não no sentido da técnica manual mais antiga, como um desabrigar da poiesis. A physis transformada em natureza, é um desabrigar que desafia o cultivo como produção. Deste modo, a técnica provoca e convoca homem e natureza.
O desabrigar que domina a técnica moderna é um desafiar que estabelece, para a natureza, a exigência de fornecer energia susceptível de ser extraída e armazenada enquanto tal.
Segundo Heidegger, o produzir da poiesis, leva o que está oculto ao seu desocultamento. O processo poiético é, portanto, alethéico que, significa desvelar. E o que se mostra no desvelamento é a verdade. A verdade como representação é o ocultamento da verdade como alétheia. Assim, a técnica pensada como meio para fins é um encobrimento do seu ser que permanece não-questionado. A técnica não é, logo, meramente um meio. É antes, um modo de desabrigar.
Neste jogo, o papel do humano é o papel da representação e da correspondência a um apelo. O homem está ao serviço da técnica quando a apoia fervorosamente e ainda quando a nega absolutamente. Negar ou aceitar são ambas atitudes cegas, correlatas das concepções de mundo e das ideologias em geral.
É por esse motivo que a técnica moderna não é um mero fazer humano. Segundo Heidegger, esta determinação é dada, pela essência da técnica, à qual, nesse sentido, o homem corresponde, ou responde ao apelo. O que apela ao homem é o que subsiste na invocação que requer e desafia: é a essência da técnica, denominada Gestell.
Como já referimos a essência da técnica é o que Heidegger chama de Gestell: uma interpelação produtora que põe o homem a desvelar o real como fundo de reserva no modo do encomendar, assim permanecendo condenado à vontade do cultivo do que é calculável em sua facticidade.
Gestell significa uma estrutura ou armação, algo como uma prateleira de livros; eidos significava cotidianamente aparência de uma coisa visível.
O homem, sujeito da técnica e sujeito à técnica, revela-se não como subjectum, mas como aquilo que se sujeita, se submete à técnica. Nesse sentido, a subsistência não é o homem, mas a própria essência da técnica: a Gestell. Todo trabalho técnico desenvolvido pelo homem é, segundo Heidegger, apenas uma correspondência ao desafio apelativo da técnica. A técnica, em essência, não é nada de técnico.
Nas palavras do filósofo: Armação significa a reunião daquele colocar que coloca o homem, isto e, o desafia, a desabrigar o real como recurso no modo do encomendar (Heidegger 2, p. 20).
Assim, armação significa a reunião daquele pôr que o homem põe, isto é, desafia para desocultar a realidade no modo do requerer enquanto subsistência. Armação significa o modo de desabrigar que impera na essência da técnica moderna e não é propriamente nada de técnico.
A armação é, enfim, a essência da técnica moderna. Assim como a essência da técnica clássica, ela também e um modo de desabrigar. Mas e um modo de desabrigar que desafia e não que produz.
A técnica em sua essência não é realizada pelo homem simplesmente, pelo contrário, ao corresponder ao apelo gestéltico é a técnica que efectua o homem. O homem nem perfaz nem efectua a técnica. Mas essa armação (Gestell) é um modo de desabrigar, é alétheia, e, assim, torna verdadeira a moderna ciência da natureza, desabrigada da physis e entendida agora como representação, como natureza. Objetivada como natureza, tornada objeto para um sujeito, ela corresponde à "postura requerente do homem", que funda a ciência exata da natureza.
Heidegger reconhece como já foi mencionado que a ciência exata da natureza, em termos historiográficos, é anterior ao advento da técnica moderna, mas somente em termos historiográficos.
Embora não seja dirigida pelo homem, a técnica, não está além de um fazer humano. O homem guia e é guiado pela técnica.
Heidegger afirma que a essência da técnica é ambígua, da mesma forma que a essência de todas as demais atividades humanas o são, porque fecha e, ao mesmo tempo, revela. Porém, a armação (Gestell) carrega consigo um risco muito maior, quando pensamos a forma e o tipo de exigência que nos coloca.
Na reificação promovida pela técnica, valores, ideias e pessoas são transformadas em objetos e moeda de troca, as instâncias do espírito se convertem em objetivações. O que antes era incomensurável agora está submetido aos ditames do cálculo. É nesse horizonte que a coisa é transformada em objeto. Heidegger antevê um perigo nesse destino técnico.
Heidegger conclui, que não é a técnica moderna em si que e o perigoso. É a sua essência, que já penetrou na essência do próprio homem. Dominado pela armação, o homem está ameaçado a perder a possibilidade de se voltar à verdade originária, a sua própria verdade.
Para Heidegger, somos conduzidos (Geschick) por um destino. No entanto esse envio histórico é também um desabrigar, é poiesis.

Considerações Finais

Em "A Questão da Técnica", Heidegger analisa talvez uma perspectiva que está omissa no que diz respeito à análise do rumo das novas tecnologias e ao que está por detrás da criação e uso da tecnologia.
Heidegger coloca também em análise pontos pertinentes no âmbito da ética ambiental. O ser humano destrói o planeta seja no sentido convencional, seja na perspectiva heideggeriana , no sentido de reduzir os vários elementos do planeta a disponibilidade/ reserva através do processo de composição.
Um aspecto que ficou excluído da equação foram também os benefícios inerentes da utilização das tecnologias.
Neste contexto, poderemos ou não aceitar a utilização inevitável da tecnologia, desde que, não seja dada permissão a que a tecnologia domine a nossa essência.

Relativamente à Gestell/armação, dá a ideia que o ser humano está confinado ao processo que o iliba de qualquer responsabilidade. Por outro lado, se as pessoas vissem Ge-stell como uma possibilidade, poderiam estar mais motivadas a ser críticas em relação à sua visão do mundo. O perigo está exatamente em tornar-se esta forma de desencobrimento dominante a ponto de o homem ver-se a si mesmo como disposição.

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